segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

LUSOFONIA - 2

(...)
Se, como defende Albert Memmi, no seu Retrato do Colonizado Precedido pelo Retrato do Colonizador (1997), existem ambiguidades e contradições, elas, pelo contrário, impulsionaram as jovens literaturas dos jovens países, num desafio brilhantemente superado de que são exemplos e testemunhos a obra de Luandino Vieira (1935) e Guimarães Rosa (1908-1967), assim como a de José Craveirinha (1922/2003) e Mia Couto (1957).

Guimarães Rosa e Luandino Vieira reinventam a linguagem, povoando os espaços vazios de significados outros. Repovoam a língua literária, descarnando a língua dos lugares comuns, levando à significação profunda e transmutada” - João Guimarães Rosa e José Luandino Vieira: A Palavra em Liberdade, Patrícia Simões de Oliveira Rosa.

Mia Couto, em entrevista a Patrick Chabal, confirma:
Quando li o Luandino, em 1977,78, isso foi importante para mim. Depois, lendo o Guimarães Rosa, senti que afinal há maneiras de fazer esse trabalho de recriação da língua. O Brasil conseguiu com o brasileiro e eu pensei que é possível fazer isto em Moçambique, com um sabor moçambicano. De criar a partir da desarrumação daquilo que é o primeiro instrumento de criação, que seria a língua, a linguagem, e os modos de uma narrativa. Por exemplo, abolir esta fronteira entre poesia e prosa. Por que é que a coisa tem que estar arrumada?

Das palavras de Mia Couto se pode concluir que “os novos griots, em seus “exercícios de estilo” (Boaventura Cardoso), promovem a interpenetração da língua (portuguesa, maior legado do colonizador, segundo Amílcar Cabral) pelo fogo das falas originárias que invadem o português-padrão; além disso, um sabor nacional é adicionado à língua de comunicação internacional” – de novo a palavra de Simone Caputo Gomes.
E a mesma autora prossegue: “como magistralmente trabalha o nosso griot maior, Guimarães Rosa, o Velho Sábio da logotecnia quando se reúnem os autores mais jovens à volta da fogueira do macrossistema da língua portuguesa, mexer na língua e na estrutura de contar para tentar criar a magia da vida é o elo e o caminho que orienta o crítico, no caso, nós, ao adentrar as oficinas desses grandes autores.
E sem “política de trânsito”, como no seu jeito espirituoso refere Mia Couto no irónico texto “Escrevências desinventosas”, de Cronicando.




Griot


Na África, onde a tradição oral é considerada como o
museu vivo da arqueologia, da história e do presente da vida social,
o dono do saber, da palavra, é o Griot.
É um dos símbolos representativos de todos os
narradores, trovadores, sábios, avós, mães
e todos os demais personagens
depositários de histórias, testemunhos ou tradições que ele conta.
São pessoas que por diversas razões, circunstâncias e habilidades,
acumularam conhecimentos que pertencem às suas comunidades
e que podemos entender como um património cultural.


E continua a mesma autora: “Tal qual num poema de José Craveirinha, outro Mais-Velho ao qual se curvam os mais jovens autores africanos de língua portuguesa, palavras rongas e algarvias “ganguissam” [namoram] em textos moçambicanos, assim como se pode quimbundizar a língua de Camões nos textos angolanos”.

Não muito diferente esta outra opinião: “José Craveirinha que nos ensinou, por via da poesia, que o sermos cultural e linguisticamente múltiplos não nos converte em seres divididos e fragmentados. Ao inverso, nós somos criaturas repartidas, capazes de viajar entre esse arquipélago de identidades de que se constitui a alma moçambicana. Celebro convosco o gosto por essa errância de quem sabe que apenas na viagem pelos outros encontraremos raiz e morada” - Mia Couto (no Ciberdúvidas da Língua Portuguesa)


Falamos, afinal, da “Lusofonia e a problemática da tradução das “Ousadias Verbais” de Luandino Vieira e das “Escrevências Desinventosas” de Mia Couto" (conferência na Esc Sec Marquês de Pombal, Lisboa, por Maria Rosa Adanjo Correia).



Melhor se compreende, agora, o texto de Mia Couto – Perguntas à Língua Portuguesa - tão divulgado pela blogosfera.


(continua)

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