terça-feira, 15 de janeiro de 2008

O GOVERNO, A SAÚDE E A SAÚDE DO GOVERNO

O azedume cresce. As vozes, mais de fora que de dentro do partido, fazem-se eco de um mal-estar que se vai avolumando cada vez mais.
Mas mesmo as de dentro vão crescendo em número e em tom.

Ou estamos perante a figura ímpar e genial de um primeiro-ministro que, contra tudo e contra todos (contra tudo o que se tem visto e contra todos os críticos), chega ao fim do mandato e apresenta obra, e se não aquela que anunciou em campanha, algo de muito próximo e equivalente... Ou teremos de dar razão a todos os que o têm vilipendiado.

O que alguns críticos têm dito a seu respeito não é muito abonatório. Bem pouco, aliás. Nem lhe traçam um perfil digno de qualquer aplauso. Muito ao contrário.

Aliás, e a propósito, a opinião que lavra por esse país fora, mais que por ele galgam os incêndios da época estival, é a de que a classe política se tem revelado tão ousada como incompetente.

O que se tem dito e redito (sobretudo fora dos meios da oposição) ou corresponde a uma verdade indisfarçável, sendo de indiscutível justiça... E aí quem está mal não são os críticos. Ou é de uma fantasiosa e condenável injustiça... E aí têm de ser os mesmos críticos a corrigir a mão e o verbo.

Assim, por exemplo: no último DM, 13JAN, reuniu o colectivo para julgar José Sócrates e ESTE PS: um jurista, um sociólogo e um escritor. Ou seja, e respectivamente, Nuno Brederode Santos, António Barreto e Vasco Pulido Valente. Todos eles colunistas em dois periódicos de referência no nosso meio: o primeiro no DN, os outros dois, no Público.

Com a bonomia que o caracteriza, NBS defende que algo se tem avançado, nesta legislatura: a contenção do défice; a reforma da Segurança Social e a reforma do Parlamento.

Para VPV, geralmente, tudo está mal. E é corrosivo até mais não. Porquê?
Ora, porquê... Porque sim.
Para ele, antes de mais, Sócrates «reduziu o Governo à menoridade, liquidou o partido, controla parte da imprensa e da televisão, absorveu a direita e tornou o PSD facultativo. Tirando Cavaco, e até esse com prudência, ninguém o limita.» E em termos de resultados de governação sintetiza: «o "reformista" não reformou coisa que se visse: apertou as pensões de reforma e espremeu o contribuinte. O "modernizador" ficou pela farsa do Simplex e distribuiu computadores pela província.» (E nesta crónica PV estava muito contido, relativamente a outras).

Barreto, que de há muito se não contem na sua apreciação negativa DESTE partido e deste governo, apresenta assim o primeiro-ministro: «todo o seu raciocínio é megalómano e pueril. As suas demonstrações não têm lógica. Das premissas, não resultam as conclusões. Os factos não são os que ele recorda. A cronologia não é a que ele invoca». Mas AB vai mais fundo e sustenta: «os sistemas de decisão vigentes em Portugal são tais que estes [falara da OTA] procedimentos, recheados de demagogia, erros, mentiras e disparates, são possíveis e não são alterados. Estuda-se pouco, estuda-se mal e estuda-se secretamente. Mas, sobretudo, estuda-se apenas o que se quer fazer. Primeiro decide-se, depois estuda-se. E só se estuda o que confirma a decisão. E pagam-se os estudos que a fundamentam. O Governo não é regularmente assessorado por gente capaz, politicamente independente e tecnicamente competente. O Governo não acredita nas virtualidades do debate público permanente e da libertação de toda a informação necessária a qualquer decisão.»

Os colunistas do Público não se encolhem nas críticas. Mas o pior é que NBS, naquele seu artigo de opinião, além de ser parco – muito parco – nas boas referências, relativamente ao executivo e ao partido que o suporta, ensimesmado e um tanto perturbado, não deixa de se questionar:

E «aqui chegados, a pergunta é: por quê, então, os protestos: na rua, no interior, nas corporações? É só défice de informação, que é a tese preferida de todos os Governos? Penso que não. Creio que houve uma deficiente avaliação das congénitas resistências à mudança e um excesso nas promessas (em que toda a oposição incorre). Há reformas que pedem já os sacrifícios mas ainda patinam, porque não eram compagináveis com o esforço de combate ao défice, não eram possíveis antes dele ou a par dele. Há medidas de mero apoio a esse combate que são dissimuladas em reformas. Há uma tendência nefasta para seguir a ideia do menino holandês: se tirar o dedo do buraco na parede do dique, todo o país é inundado.» E, antevendo alguma razão nos generalizados protestos, chega mesmo a propor: «agora era o bom momento para mostrar ao país (...) as razões de alguns erros cometidos».

A sentença do colectivo (algo convergente) ficou adiada para ocasião mais propícia.






Um dos dois ou três maiores alvos de protestos deste governo têm tido a ver com “as reformas” na área da Saúde. E, aí, está imparável hoje (Público) José Vítor Malheiros nos “Excertos do diário íntimo de Correia de Campos” que ele imaginou, com uma graça e uma realismo impressionantes. Imagine-se, só, CC falando de si para os seus botões (e para os colaboradores, claro): “há pessoas muito estúpidas. Há pessoas tão estúpidas que nem sequer percebem que, quando se fecha o serviço de urgência do hospital da sua terra, isso é para o seu bem.” “E há mais: há pessoas tão supinamente estúpidas que nem percebem a diferença entre Serviços de Urgência Básica, Serviços de Urgência Polivalente e Serviços de Urgência Médico-Cirúrgica (como se eu já não tivesse explicado o que significam estes conceitos) e que dizem que tudo o que querem é poder ter acesso rápido a cuidados médicos em caso de necessidade. Uma tristeza”. Ou seja: “há pessoas tão estúpidas que nem percebem a diferença entre um SUB, um SUP e um SUMC”.
Mas o delírio do imaginador, avaliando o do imaginado, vai num crescendo espectacular.
“Mas isto ainda não é tudo: há pessoas que são tão estúpidas que nem percebem que não tem a mínima importância terem de se deslocar umas dezenas de quilómetros até ao SUB ou SUP ou SUMC, conforme o caso, porque podem apanhar um táxi ou uma ambulância ou mesmo um helicóptero. Algumas destas pessoas são tão indiferentes às prioridades da organização da rede de urgência que levam o seu egoísmo ao ponto de se queixarem da despesa e do incómodo que essas deslocações lhes causam. O que são 200 ou 300 euros quando é a saúde que está em causa?”
“E até há pessoas tão estúpidas (algumas delas altamente colocadas) que acham” que em matéria de saúde, o país está um caos!
E para rematar este paranóico conjunto de excertos das cogitações do arrebatado ministro, conclui:
“Há outras pessoas que são tão estúpidas (incluindo pessoas que fazem parte de comissões técnicas que até deviam perceber destas coisas) que acham que as intervenções na rede de urgências começaram a ser feitas antes de se ter pensado no quadro global e que se está a pôr o carro à frente dos bois e a tomar decisões avulsas conforme as pressões locais.Há tantas pessoas tão estúpidas que acho que a única solução é mesmo dissolver o povo. Ia reduzir o acesso às urgências.”

E aqui, que dizer?
E que fazer?


1 comentário:

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
 

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