“Quase todas as sociedades tendem a amarfanhar e a desprezar os seus casos de sucesso. A inveja é um sentimento crescente nas sociedades mediatizadas em que quem sai da mediania é para abater.”
Casos de sucesso, arduamente conquistados, numa labuta diária, são a dos nóbeis e dos cientistas que duramente conquistam o sucesso e a projecção dos seus nomes.
A esses ninguém o amarfanha, ninguém os despreza, ninguém nutre por eles qualquer espécie de inveja.
Os políticos que forjam, descarada e destemperadamente, as melhores condições do seu futuro, esses não provocam sentimentos de inveja, mas uma indignação justíssima, até porque, relativamente à sociedade em geral, defendem regras e princípios que esquecem despudoradamente na resolução dos seus casos pessoais.
É o princípio da verdade e da transparência que estão em causa e são pura e simplesmente ignorados.
O mesmo se passa com os empresários (banqueiros, especialmente incluídos), que com um percurso atapetado de pétalas, sem obstáculos ou dificuldades – pelo contrário, cheio de mordomias e facilidades – levam de vencida os seus negócios fabulosos.
Também não é inveja o sentimento que esta situação suscita: antes, igualmente, de indignação, por terem um tratamento altamente privilegiado e protector.
O sr Prof Campos e Cunha refere (eu atrever-me-ia a dizer, com ingénua displicência, sabendo embora que só na aparência assim é – como quase tudo em política) que os banqueiros “cumprem a sua obrigação de defender o investidor e utilizar os mecanismos legais para terem lucros líquidos mais elevados. É essa a sua obrigação e eles cumprem.”
Impressionou-me o argumento: o povo, acossado pelo aumento de custo de vida, pelo aumento das cobranças fiscais (na quase generalidade conseguida à sua custa) e pela diminuição dos seus rendimentos, e lutando ainda contra uma constante degradação dos serviços (saúde, educação, outros), vê-se e deseja-se para subsistir com o mínimo de dignidade.
Pois, tamanha e paralela é a tarefa que aos banqueiros se apresenta e eles têm a felicidade de conseguir vencer. Sós.
Ambos lutam arduamente, e não obstante a maior dificuldade dos seus objectivos e do percurso que lhes conduz, os banqueiros conseguem (talvez com a ajuda de Deus) atingir a sua meta.
Há duas afirmações que o Sr Prof Campos e Cunha fez sem esboçar um sorriso nem uma hesitação:
“os bancos estavam semifalidos na hora da privatização e transformaram-se em empresas rentáveis e, mesmo, muito rentáveis.”
Não se diz aí, mas noutro lugar da sua coluna: a banca “passou de um sector arcaico, burocrático e protegido para um sector moderno, competitivo e habituado à concorrência internacional.”
Como?
Por obra e graça do Divino Espírito Santo. A protecção de que ali se fala... Foi por distracção que se referiu.
Depois: “Apesar de notícias de quebra nos lucros dos principais bancos portugueses” – afirma sem titubear, o Prof.
Deve tratar-se de outro planeta, aquele onde os economista habitam...
Curiosíssimo é ainda o argumento fantástico que se segue:
“Se os bancos pagam menos IRC do que alguns gostariam, então a "culpa" é da lei e de quem a aprovou, não dos banqueiros. Estes cumprem a sua obrigação de defender o investidor e utilizar os mecanismos legais para terem lucros líquidos mais elevados. É essa a sua obrigação e eles cumprem.”
Isto, tudo leva a crer, sem uma ponta de vergonha. O descaro total.
Claro que todos respeitamos o saber de tão gradas figuras da economia.
Mas vivemos um dia-a-dia que está em flagrante contradição com tão sábias análises e previsões.
O mundo real será o que se projecta nos seus “laboratórios” ou será aquele que a vida nos revela?
E a nós, aos mais ingénuos (nós, sim, ingénuos) coloca-se uma importante questão: o mundo existe por mor da economia, ou vice-versa?
É o mundo que tem de adaptar-se à economia?
Nesse caso, como resolver o problema da crescente fome no mundo?
Neste momento esse número atinge a preocupante cifra de mais (muito mais) de 800 milhões de cidadãos com fome...
Mas faz-se uma apologia, bem pouco discreta, do lucro. De cada vez maior lucro.
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