Exactamente: não se trata, já, de um expediente, mais ou menos engenhoso, por vezes perverso. Nem se trata da mentira piedosa, por isso compreensível e perdoável.
Não se trata de uma falha na comunicação: querer adoptar uma visão optimista, proclamá-la, enfrentar o pessimismo geralmente instalado entre as gentes mais comuns. Querer contrariar, alterar, melhorar a realidade mais evidente.
Não se trata de uma consequência mal calculada ou (muito menos) imprevista de um momento de euforia e de um discurso aparentemente bem intencionado.
Não se trata de um desastre, de uma situação para que se foi arrastado, por impossibilidade de garantir a eficácia daquele discurso bem intencionado.
Não se trata de um logro em que –sem a menor intenção – se caiu.
Não se trata de se ser convencido pelos últimos, mais dificilmente identificáveis, mais invisíveis detentores do poder, convertendo-se, inesperadamente, a uma lógica e a uma política que são a antítese dos seus anteriores propósitos e projectos.
Não se trata de um erro condenável. De uma atitude pérfida. De uma mentalidade desprezível. De uma personalidade igualmente abjecta. De uma deslealdade. De um execrável procedimento.
Mas como? Sempre? No nosso convívio do dia-a-dia?
Não. Em política.
Na política, de há muito que não. De maneira nenhuma. Em absoluto.
Trata-se, antes, de uma virtude. Uma recomendável qualidade. De um imprescindível, necessário, útil, geral e recorrente modo de proceder.
Mas quem aborda esta questão com a serenidade e a crua análise que lhe são conhecidas, é António Barreto. Na sua coluna semanal do Público, RETRATO DA SEMANA, de hoje, e que desta vez se intitula “DA MENTIRA COMO VIRTUDE POLÍTICA”.
E não se esquece de esclarecer que a mentira (na política) não é uma “prerrogativa” dos governos musculados ou totalitários. Não: tornou-se igualmente comum nas modernas democracias.
E se AB não esquece essa aclaração, também não deixa de nos trazer à memória casos e nomes concretos acerca da matéria. Domésticos e da cena internacional.
António Barreto deixa, no seu texto, uma apreciação muito comum que o próprio jornal destaca:
"Não fazer o prometido, deixar de o fazer ou fazer outra coisa é uma forma de sublinhar a mentira original. Mas também passa, na política, por benigno constrangimento".
Mas a dada altura saiu-lhe a frase lapidar, a verdade que todos constatamos:
"A mentira, a fria mentira transformou-se em instrumento de governo".
E ao questionar-se, no final do trabalho, sobre se “será possível contrariar esta nefasta” realidade... Acerca de certos políticos é impiedosamente imperativo: “não há esperança”. Ah, mas relativamente a outros ainda arrisca um “é difícil”, que não sendo animador, também não nos remete para o completo desânimo.
Ora, porque é um texto básico, paradigmático e exemplar, merece integrar as memórias do Apostila. E aí vai ficar: “DA MENTIRA COMO VIRTUDE POLÍTICA”
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