Quando, recentemente, um grupo de empresas privadas próximas do Kremlin comprou a maior rede de rádio privada da Rússia, os novos donos impuseram uma nova regra: teria de haver em cada noticiário um mínimo de 50% de notícias positivas...
Há que fazer aprovar, urgentemente, e, com idêntica pressa, implementar regra semelhante em todos os noticiários da lusa comunidade.
Mas em Portugal, com as “chic’espertices” que logo se inventariam, não é aplicável qualquer fraccionamento. Logo descambava. Assim, na nossa “praça”, as más notícias, por natureza ou por arrastamento, as desgraças e outros acepipes que os indígenas apreciam, nada disso podia passar ou ser abordado no noticiário. Só no fim do mesmo.
(Exemplos de más noticias por natureza ou por arrastamento: falar do aumento do Iva ou da bandalheira da Un Independente, são, em si, más notícias. Falar em Sócrates, é um exemplo de má notícia por arrastamento, pois não se pode falar de Sócrates sem que a conversa resvale para o Iva ou para a Independente).
Assim, o dito horário nobre – parte dele, obviamente – deverá ficar imune a quaisquer tiranias, corrupios de desgraças e a todas as fraudulentas manobras de convencimento político, comercial e outros do utente.
Imagens do naufrágio dum paquete (não falo no Vara, falo num navio) ou dum país?
Corta.
No fundo são estimáveis razões ecológicas as que presidem a tal determinação.
Pretende-se diminuir os níveis de poluição sonora e os efeitos de uma irrespirável ambiência (assuntos dos bastidores do futebol, envolvendo destacadas figuras públicas, como o major, Pinto da Costa, Alberto João Jardim, o sargento brasileiro da selecção ou Madaíl...)? O assunto não pode ir para o ar. Tem de esperar.
O que se quer é prevenir a eco-arte audiovisual? Corta-se o pio, por cerca de uma hora, ao Quim Barreiros, Roberto Leal, Clemente, Tony Carreira e quejandos.
O que se pretende é evitar o turibular e cansativo incensamento de virtudes que cheiram a mofo, de personagens cujo rastreio as colocou já há muito na prateleira das inutilidades e dos esquecidos? Ou então poupar-nos ao discurso alucinante mas que não tem o mínimo apoio em qualquer realidade planetária? Não se abre a antena a César das Neves, a Mário Pinto, a Bagão, ao engenheiro-treinador, a Luís Delgado, à Laurinda Alves, ao Nogueira Pinto.
O que se quer é poupar a nossa paciência face aos vendedores de ilusões e de promessas irrealizáveis, aos menezes, aos valentinsloureiros, aos isaltinos, aos ferreiratorres, aos santanalopes, aos pps, a outros iluminados que tais que querem que sejamos nós a pagar o azeite suíço das suas candeias?
Mandam-se bugiar até à hora – pouco depois - em que o consumidor-tipo tudo consome, com tudo delira, com tudo se deleita.
Pretende-se salvaguardar as pessoas equilibradas, as pessoas mentalmente sãs, de toda a espécie de relato de desgraças, de desastres, de calamidades, de incêndios? Por exemplo daquelas frequentes, minuciosas, demoradas e extraordinariamente circunstanciadas imagens, e de variadíssimos ângulos, acerca do estado em que alguém ficou após um acidente e dos comentários de intervenientes, amigos, vizinhos, passantes ocasionais, testemunhas profissionais e outros segregadores da mesma saliva e da mesma adrenalina, perante tão cruas e fantásticas imagens?
Pois, nem na TVI à hora do noticiário. Proibido. (Ainda que à TVI lhes fiquem reservadas todas as mais horas para tão magnos assuntos)
Corta-se. Deixa-se para daí a pouco.
Por mor da prestimosa lei que acautela os níveis de audiência, cuja guerra é sacralizada e incentivada pelo capital, tais conteúdos seriam, então, redireccionados para o horário das telenovelas, já que esse público se compraz, particularmente, com todos os horrores, desgraças e despautérios que lhe servirem.
Mas, a bem da sanidade mental daqueles que a querem manter e preservar... Ponha-se essa lei em vigor. Já.
Por uma hora ou duas por dia... Poupem-nos.
2 comentários:
Eco-arte-audiovisual?!
Venha ela!
Valha-nos S.Berardo!
O comentário anterior é que me alertou para o seguinte: esqueci-me de pôr aspas em "eco-arte". Da minha lavra é só o audiovisual...
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